domingo, 8 de abril de 2018

Dia 30 - 04-01-18 De Calama a Paposo


Trigésimo dia

04-01-18 De Calama a Paposo
Acordei com o sol saindo e o reloginho batendo. Feito o serviço, fui desmontar a barraca para seguir para o litoral pela ruta 1. Eu já tinha passado por esta estrada em 2013, mas não lembrava de quase nada, então pra mim foi novidade, tanto que fui parando em varias oficinas, nome dado a minas de extração de salitre, a ruta 25 tem várias delas todas do inicio do século XX até perto de 1940 e depois abandonadas as cidades e oficinas. Andei por algumas delas e seus cemitérios. Os cemitérios são uma curiosidade a parte, em geral com sepultamentos entre 1910 e 1950, tem as cerquinhas e cruzes todas de madeira que ainda resistem ao tempo e em algumas há placas de bronze com as datas e alguns dizeres. Fico andando por lá lendo algumas delas. Muitas das sepulturas estão abertas por ladrões de crânio, nenhuma das abertas tinha crânio nos caixões e alguns nem ossos tinham mais. Uma curiosidade nos cemitérios é que geralmente tem uma ou duas sepulturas de criança ainda sendo cuidada e nessas as pessoas deixam brinquedos, doces e moedas e isto também ocorre nas casinhas em homenagem as pessoas que morreram em acidentes nas estradas as de crianças e adolescentes geralmente tem moedas, brinquedos e doces. Sei lá se é normal isso, mas eu para pra visitar várias dessas, as vezes tem placas com dizeres bonitos.



























La Mano del Desierto

Em virtude dessas paradas o dia não rendeu na estrada, consegui chegar a Paposo, primeira cidade do litoral que eu cheguei, fica a 50 km de Taltal.
O bom de se viajar sem data pra voltar é que dá pra ir parando, vendo as coisas com calma, no meu tempo, coisa que nas outras viagens eu deixei passar por falta de tempo nesta eu estou aproveitando, é outra vibe a viagem.
Achei uma praia legal a uns 5 km depois de Paposo e montei minha barraca de frente para o mar, amanhã quero ver se faço render pelo menos 500 km.







Dia 29 - 03-01-18 De Salar de Ascotan a Calama


Vigésimo nono dia.
03-01-18 De Salar de Ascotan a Calama
Mais uma noite gelada, -6 graus dentro da barraca e -13 graus lá fora. Novamente a moto e a barraca congeladas. Como estava acampando na borda de um salar a humidade do ar ainda é alta, logo a sensação e o frio são maiores e pelo segundo dia seguido sou obrigado a fazer o numero 2 com temperatura abaixo de zero. O intestino regulou para as 6 horas da manhã e não tem como segurar e como não tem banheiro no hotel de bilhões de estrelas o jeito é improvisar.
Desmontei a barraca e segui para a estrada, tinha 50 km pela frente até chegar a outra estrada que levaria a San Pedro de Atacama pelas montanhas passando pelo gêiser Del Tatio.
Devolta ao asfalto eu cheguei até um vulcão pequeno que quando passei na ida pensei em subir mas deixei quieto, dessa vez eu teria que subir. Deixei a moto lá perto e fui subir, eram 160 metros de altura para subir pela encosta do mini vulcão, iniciei em 3540 metros e mesmo estando a quase um mês a mais de 4000 metros de altitude eu tive que fazer mais de 10 paradas para tomar ar, mas valeu a pena.

 Cheguei na cratera que lá debaixo parecia que seria pequena, mas era grande e a visão lá de cima era muito bonita, era possível ver outros vulcões e as planícies do deserto. Para descer foi fácil, não cansa. Cheguei na moto eram 11 horas e decidi almoçar, enquanto almoçava ouvi o barulho de uma moto com escape esportivo se aproximando e passaram duas motos. Pensei comigo que só podiam ser brasileiros, continuei comendo meu pao com sardinha e depois de um tempo ouvi aquela moto roncar e vi eles parados a uns 2 km. Devia ter estragado pensei. Terminei de comer e fui lá ver se poderia fazer alguma coisa. Eram 2 catarinenses de Brusque, um até já tinha conversado comigo pelo Facebook. Conversamos um pouco e o cara da moto barulhenta, uma Bros 125, disse que estava com problema na carburação por conta da altitude, mas que já tinha resolvido, tirou o filtro e ia seguir sem. Nos despedimos e fui para o meu sofrimento do dia.





Cansei de empurrar

Peguei a estradinha, ruta B145, que inicia na ruta 21 a 80 km de Calama, inicialmente era estrada boa, mas logo tornou-se a minha maior provação. Nos primeiros quilômetros ela alterna entre estrada boa, costela de vaca, buracos e algumas partes com areia, lá pelo quilometro 35 a coisa começa a realmente ficar feia, com grandes trechos de pura pedra fininha misturada com areia com até 30 cm de profundidade de terra solta onde a moto só anda comigo do lado ajudando a empurrar. Passei por uns 3 trechos de uns 100 metros assim até mudar para a estrada ao lado, que estava um pouco menos pior. Elas se uniram lá na frente e logo se separaram novamente e na que era a principal tinha uma placa avisando: “Camino mal estado”. Continuei por aquela paralela achando que elas se cruzariam lá na frente e na verdade esta paralela cruzou um salar e ia para o alto da montanha, eu decidi que não iria mais para San Pedro, se até ali onde não tinha placa avisando das condições da estrada já estava o inferno, imagina se eu continuasse por onde a placa avisava que não estava bom. Agora eram mais 35 km para voltar para o asfalto da ruta 21 e mais sofrimento. Voltei pela paralela que na vinda eu passei em partes dela e estava melhor que a principal, mas tinha uma parte de uns 300 metros de puro areão que foi pra pagar muitos dos pecados que cometi. Parei varias vezes para descansar e empurrei bastante a moto no areão. As costas doíam, dor muscular, tamanho era o esforço, tive que tomar um torsilax para ver se doía menos. Passado esta parte eu pude ver um pouco da fauna do local, uma marreca selvagem com filhotes no rio e uma Suri com ums 10 filhotes, o Suri é uma ave de tamanho entre uma Ema e um Avestruz, se parece muito com eles.
Voltei para o asfalto e segui até Calama. Parei num shopping e fui ao mercado, la comprei varias sopas e arroz para minhas próximas refeições, no Chile não dá pra ir em restaurante. Comprei por R$17,50 4 coxas com sobrecoxas assadas, seria meu almoço de hoje e de amanhã, já que só consegui comer duas. As sopas ficam num preço muito bom, comprei várias de vários sabores, frutas quase não dá de comprar de tão caro, a maioria na faixa dos R$10,00  o kilo.
De lá fui abastecer e sai da cidade já com o sol se pondo e uns 10 km depois da cidade entrei no deserto e montei minha barraca atrás de um monte de areia agora é só descansar porque o dia puxado.



Dia 28 - 2/01/2018 De Lirima a Salar de Ascotan


Vigésimo oitavo dia
2/01/2018 De Lirima a Salar de Ascotan

Como o previsto a noite foi muito fria, marcava -7 graus dentro da barraca pela manhã e fora marcou -13 graus. Estava tudo congelado, a moto, barraca e a água. Tive que esperar descongelar a barraca para poder guarda-la. Não passei frio, mas usei tudo que tinha.
Depois de pegar a estrada o gelo ainda ficou no painel da moto por uns 50 km e eu andando com o macacão de pantera e jaqueta.



A estrada A97B que liga Colchane a Ollague, até a mina Collahuasi alterna entre asfalto e pista de barro, porem muito bem cuidada e sem grandes atrativos, exceto pelo salar de Huasco, alguns vales e picos ainda nevados para se ver. Da mina até Ollague a estrada, se é que se pode chamar é bastante mal cuidada, com muitas costelas de vacas, pedras e partes com bolsas de areia e vários desvios para o deserto em busca de um piso melhor. Deve ser por conta do transito dos caminhões da mina. A mina é uma mina de cobre  e ouro no meio da cordilheira, tem um lago de rejeitos azul.
Um pouco depois da mina tem uma cidade abandonada, Yuma é o nome, fica a 4401 metros de altitude e aparentemente era utilizada para para tratamento de algum minério, tinha até estação de trens por lá para buscar o que era tratado lá.
Salar de Huasco

Salar de Coposa

Represa de rejeitos da mineração do cobre








Desta cidade até Ollague a estrada fica um pouquinho pior, com bastante areão e estrada por cima de laje de pedras e péssimas condições e para ajudar o vento aumentava e quando pegava de lado quando tinham costelas de vaca a coisa ficava perigosa, mas consegui chegar à Ollague a salvo e fui buscar por gasolina, pois já estava na reserva. A Biz tá fazendo uma média bem ruim ultimamente, no tanque anterior fez 24 de média e neste fez 30. Consegui comprar 11 litros pagando R$8,82 o litro, caro, mas era o que tinha. Enquanto abastecia chegou um senhor e sua esposa do RS com uma GS 1200, indo para Uyuni e também procurando por gasolina, fez as contas e colocou só o suficiente para chegar em San Cristobal, não é só quem anda de Biz que faz contas para economizar.
Voltei para a estrada, agora pelo asfalto até a saída depois do salar de Ascotan, peguei a estradinha que tinha planejado e segui por uns 5 km até que ela começa a subir um encosta e com muita “brita” fininha, impossível de uma moto passar por lá de boa, quem sabe uma de rallye conseguisse, resolvi voltar, já era final de tarde e antes de chegar no asfalto montei minha barraca ao lado de um morro, mais ou menos protegida do vento.




Dia 27 - 1/01/2018 De algum lugar no deserto da Bolivia a Lirima no Chile


Vigésimo sétimo dia
1/01/2018 De algum lugar no deserto da Bolivia a Lirima no Chile

E 2018 começou e eu estava no meio do deserto da Bolívia sozinho, um jeito estranho de começar o ano, mas eu estava feliz. Foi uma noite tranquila e só me restavam uns 100 km de estrada de chão para chegar ao Chile. Andei até Negrillos, onde abasteci a moto, pois achava que não daria para chegar até a fronteira, paguei 9 bolivianos por litro, mais que o preço pra turista, em uma tienda, mas era o que eu tinha de opção e foram-se todos os meus Bolivianos (dinheiro). 


Segui até o próximo pueblo e pedi para um morador qual era o caminho para Pisiga e ele me apontou as montanhas, pelos pontos que eu tinha marcado no GPS o sentido não era aquele e pela folha que eu tinha impresso com um roteiro também não era por lá, mas como eu tinha o tanque cheio e podia arriscar resolvi ir por onde ele falou. Subi uma montanha e do alto podia ver o vulcão Tata Sabaya, que seria minha referência de estar indo para o lugar certo e na real estava, era outro caminho que também chegava lá. O caminho é bonito, passando por montanhas  e bofedales, espécie de alagado todo verde onde os animais vem beber água. Passei por alguns pueblos, em um deles vi duas crianças e lembrei de dar os brinquedos pra elas, quando eu estava voltando para entregar os brinquedos a mãe delas se escondeu de vergonha, entrei e sai e quando olho pelo retrovisor a mulher ia saindo de trás do muro. Típico de pessoas do interior de qualquer país.





Cheguei em Pisiga era meio meio dia, fiz o câmbio suficiente para completar o tanque e almoçar, abasteci, almocei e fui pra aduana. Estava vazia, peguei os papeis que sempre são os mesmos quando se entra no Chile, preenchi e fui para a imigração da Bolívia fazer minha saída e o cama me mandou ir primeiro pra aduana, inverso de todas as outras imigrações da Bolívia. Beleza, fiz aduana, depois imigração e depois a imigração chilena e quando fui fazer a aduana chilena, que sempre é um saco, mas dessa vez seria pior. Tinha um agente de mal humor fazendo tudo que podia pra me irritar. Depois de termido no balcão ele foi fazer a revista e pediu pra tirar tudo de dentro do bau e levar para o scanner as coisas maiores, nunca precisei fazer isso. Beleza, levei e passei pelo scanner e depois veio o outro agente da SAG, fiscal das coisas derivados de animais e vegetais, revistou novamente o que o primeiro agente tinha revistado e pediu pra ver o bau central, tirei as coisas de la, deixei só as sardinhas e o chocolate. Ele colocou a mao lá dentro pra ver o que tinha e achou uma sardinha ao molho de tomate estourada, eu procurei e não achei ainda, ele tirou a mão com os dedos sujos de sardinhas e fez uma cara de nojo. Ali eu ganhei o dia e e ele parou a procura e saiu. Com um sorriso no rosto comecei a  guardar as coisas tudo novamente com calma e sempre lembrando da cara dele.
Tudo guardado segui pela ruta 15 até a saída para o que eu esperava ser estrada de chão e para minha surpresa era asfalto, uns 30 km até começar a estrada de chão tão boa que dava pra andar na mesma velocidade que no asfalto, segui nela até chegar a subida da montanha que eu chegaria a 5045 metros de altitude. 



A moto já estava sem força e ainda tinha um vento contra para atrapalhar, ela foi até 4558 metros e parou, tive  então que trocar a coroa para continuar a subir e mesmo assim chegou uma hora que eu tinha que ir fazendo zig-zag na estrada e ainda ajudar com o pé no chão para terminar de subir, mas consegui. Lá em cima o frio era grande e quando comecei a descer que passava as sombras o frio era cortante. O sol estava baixando e eu ainda estava em cima da montanha e acampar por lá não seria uma boa, mas chegou uma grande ladeira que me levava para uma planície, no fim dela eu vi uma cava e fui lá ver se dava pra acampar dentro, pois ventava bastante. Depois de uns ajustes no chão eu pude montar  a barraca e entrar, pois o frio era grande e a madrugada prometia ser bastente fria.


Dia 26 - 31/12/2017 - De Sajama a algum lugar no meio do deserto na Bolívia



Vigésimo sexto dia.
31/12/2017 - De Sajama a algum lugar no meio do deserto na Bolívia
A noite não foi das mais tranquilas, durante a noite tive que levantar para mudar a barraca de lugar. Onde eu tinha montando ela o chão estava muito quente, mesmo com o colchão inflável ainda ficava quente demais, pelo menos uns 60 graus estava o chão. Vi que se apenas mudasse um metro para o lado já ficaria mais frio o chão e fiz isso, mas quando fui la fora ver o chão estava mais frio por conta de que lá fora estava frio e esfriava a camada externa do solo e depois de uma meia hora de eu trocar a barraca de lugar o chão já estava quente novamente, aí desisti e tentei dormir assim mesmo. Foi uma noite mal dormida.
Pela manhã peguei as roupas que tinha deixado de molho no córrego e coloquei pra secar, também coloquei i saco de dormir pra secar, pois o calor do chão fez suar e molhou por baixo, a barraca também estava encharcada por conta dos vapores e tive que estender o sobreteto para que secasse. Enquanto fazia estas coisas deixei uma sardinha esquentando no gêiser para o café da manhã. Fiz a barba no gêiser também.
Quando terminava de montar as coisas na moto as roupas já tinham dado uma boa secada e as que precisavam secar amarrei sobre o baú junto com os tênis. Saí de lá e fui para as termas, distante uns 10 km, mas no caminho tinha um rio que a moto não passava e tive que passar por uma ponte feita com uns 4 paus paralelos e podres, arrisquei e passei, mas foi tenso. Deixei a moto no estacionamento e as roupas estendidas pelas moitas de capim e fui tomar meu banho nas aguas termais a 35 graus. O governo fez duas piscinas, um restaurante e um vestiário para os turistas. Bem legal o lugar e a água uma delícia. Fiquei lá quase uma hora, tempo da maioria das roupas secarem, ficou só a calça jeans e os tênis para terminar de secar sobre o baú. De lá fui terminar de fazer a estrada que contorna o nevado Sajama, ao todo dá 100 km para dar a volta nele, sendo uns 80 de estrada de chão que varia entre areia, pedras com areia e outras partes com muitas costelas de vaca que fazem o passeio virar uma tortura, mas vale a pena.






Almocei um charquitan, charque frito e desfiado com um milho típico cozido, ovo cosido com casca e camote, um tipo de batata, em um restaurante na beira da estrada e voltei pra Tambo Quemado, para pegar a estrada que me levaria Pisiga pelo Circuito do rio Lauca, é uma estrada que passa por algumas atrações, como Chullpas, formações rochosas, entre outras coisas. É uma variação de estradas mais ou menos e estradas ruins, sendo areia, costelas de vaca  e chão com pedras e em muitas partes há desvios para o deserto onde se anda na areia com mais conforto. O Rio Lauca quando cheguei achei que não conseguiria passar, tamanha era sua largura, deixei a moto, levantei as calças e fui pesquisar onde era o melhor lugar pra passar e ví que era possível, voltar uns 100 km de estradas ruins não era opção.








Passando o rio fui visitar as Chullpas Policromas, eram sepulcros de chefes Inkas, inclusive em uma delas ainda havia uma caveira. Estas Chullpas são diferentes das outras por serem coloridas, pigmentos foram adicionados na argila e nas faces figuras podem ser vistas. Estas ruinas datam de entre 1470 e 1530.
Para acampar encontrei um local de onde era tirado o saibro para a estrada e lá protegido do vento montei a barraca. Era visível da estrada, mas como neste dia não passei por ninguém na estrada não faria diferença nenhuma, poderia acampar no meio da estrada se quisesse. Ali seria minha passagem de ano.